Uma cidade sem solução, por Roberto Freire

Desordenamento urbano. Especulação imobiliária. Falta de acessibilidade. Insegurança permanente. Trânsito caótico. Transporte ineficiente. Descaso com o Meio Ambiente. Esse é um recorte da realidade encarada por 1,6 milhão de recifenses e seus vizinhos da região metropolitana.

O caos é tão intenso que não é possível encontrar solução. Será maldição? De gestão em gestão, a ideologia inversa de governar sem priorizar os interesses dos moradores, atendendo demandas impostas pela classe dominante, foi enraizada nas instituições públicas. Até mesmo a população, que tem sido, por décadas, a mais prejudicada, congrega com decisões dissociadas dos interesses de uma cidade decente.

Nesse cenário, onde a desordem prevalece, a Prefeitura do Recife convoca a população para a revisão do Plano de Ordenamento Territorial, no qual está contido o Plano Diretor. Um planejamento municipal que deveria reunir estratégias, diretrizes e regras para orientar o desenvolvimento urbano.

Com o mote “com você, pensando e fazendo a cidade”, o poder público tenta ludibriar os recifenses de que essa construção pode ter um caráter democrático e promover a qualidade de vida de todos os seus cidadãos.

Sem desmerecer a boa vontade da sociedade organizada, que se organiza e tenta participar ativamente das etapas da revisão do Plano, de pouco adianta fazer essa discussão.

A começar pelo prazo definido pelo Governo para finalizar a revisão: QUATRO meses. Discutir 10 anos, que é o tempo de vigência do Plano Diretor, em QUATRO meses é atestar que a participação popular e a construção coletiva só servirão para legitimar algo que já está desenhado. E quem desenhou, não há dúvidas, visa dar continuidade a deterioração do espaço público, servindo aos grandes grupos econômicos, os mesmos que, sempre, orientaram a depredação da capital pernambucana.

O problema se agrava com o caminho burocrático que o Plano ainda percorrerá. Após a finalização da revisão, realizada pela Prefeitura, o projeto seguirá para a Câmara de Vereadores do Recife. Uma Câmara que, salvo raras exceções, é composta por parlamentares sem qualificação e sem representatividade. Uma Câmara alheia à cidade. Vereadores que não vivem o dia a dia dos moradores, não conhecem as comunidades, não entendem as necessidades da população. São representantes dos mais variados tipos de interesses, menos daqueles pelos quais deveriam ter sido eleitos.

Ou seja, o planejamento urbano municipal, para os próximos dez anos, que poderia iniciar um novo ciclo, não nos trará uma nova cidade, nem esperança de inversão de valores. Seguirá, assim, servindo aos eternos senhores e pisando na sociedade.

 

Roberto Freire é engenheiro eletricista e diretor do Senge-PE